Autoestima em adolescentes com anorexia

adolescentes com anorexia

A relação entre peso corporal e autoestima em adolescentes com anorexia nervosa (AN) pode não ser tão direta quanto se imagina. Um estudo publicado no Journal of Eating Disorders mostra que, para meninas em fase de desenvolvimento, não é o índice de massa corporal (IMC) que mais influencia a percepção de valor pessoal, mas sim a interpretação que elas fazem do próprio corpo.

O que revelou a pesquisa

Linda Lukas e colegas recrutaram 40 adolescentes com anorexia nervosa e 40 sem transtornos mentais, todas entre 12 e 18 anos (mediana de 15). Após medir o IMC, avaliaram:

  1. Insatisfação corporal, por meio do Body Shape Questionnaire
  2. Autoestima, usando a Rosenberg Self-Esteem Scale
  3. Viés de interpretação corporal, com a tarefa de frases embaralhadas (Scrambled Sentences Task)

Nos resultados, o IMC não explicou nem a autoestima nem a insatisfação corporal no grupo com anorexia nervosa. O que realmente previu esses indicadores foi a frequência de interpretações negativas do próprio corpo. Mesmo jovens abaixo do peso ideal continuavam se vendo como “gordas” ou “inúteis” quando exibiam viés negativo alto. Em contraste, no grupo sem anorexia nervosa, tanto o IMC quanto o viés de interpretação influenciaram autoestima e satisfação corporal, indicando que, naquele grupo, peso e percepção caminhavam juntos.

Por que a interpretação importa mais que a balança

Adolescentes vivem uma fase delicada de formação de identidade e estão expostas a padrões de beleza muitas vezes irreais. Em quem tem AN, cognições distorcidas funcionam como uma lente que amplifica qualquer imperfeição percebida, tornando impossível aceitar o próprio corpo mesmo quando este está abaixo do peso. Esse mecanismo alimenta um ciclo em que cada autojulgamento negativo reforça a insatisfação, baixa ainda mais a autoestima e perpetua comportamentos de restrição alimentar.

Adolescentes com anorexia implicações para tratamento e prevenção

Os achados destacam a importância de trabalhar não apenas metas de peso em tratamentos de AN, mas também crenças disfuncionais sobre o próprio corpo. Estratégias essenciais incluem:

  • Terapia cognitivo-comportamental focada em identificar e reestruturar pensamentos automáticos negativos
  • Exercícios de exposição corporal graduais para dessensibilizar a ansiedade ao olhar e tocar o próprio corpo
  • Treinamento em autocompaixão para desenvolver uma postura interna mais acolhedora e menos crítica
  • Educação familiar para reforçar percepções positivas e evitar comentários sobre peso e forma corporal

Orientações para pais e educadores de adolescentes com anorexia

  1. Valorize comportamentos saudáveis que não envolvam aparência, como esforços nos estudos ou talentos artísticos
  2. Evite comentários sobre peso, mesmo que sejam bem-intencionados
  3. Promova conversas críticas sobre mídia e padrões de beleza irreais
  4. Fique atento a sinais de alerta, como isolamento social, mudança drástica de hábitos alimentares e obsessão com exercícios

Quando buscar ajuda

Se você identificar que a adolescente apresenta qualquer um dos sintomas a seguir, considere procurar apoio profissional:

  • Isolamento social e mudanças de humor
  • Foco obsessivo em peso e alimentação, como recusar grupos alimentares ou contar calorias de forma excessiva
  • Queda acentuada de peso ou manutenção de peso abaixo do recomendado para idade e altura
  • Baixa autoestima constante, com descrições de si mesma como “feia” ou “inútil”
  • Sintomas físicos como tontura, cansaço extremo, queda de cabelo ou problemas gastrointestinais sem causa aparente

Comece conversando com o pediatra, que avaliará o estado geral de saúde e poderá encaminhar ao especialista adequado. Em seguida, nutricionistas, psicólogos e psiquiatras podem oferecer um plano integrado de suporte, combinando reestruturação cognitiva, acompanhamento alimentar e cuidado médico. Quanto mais precoce a intervenção, maiores as chances de interromper o ciclo de insatisfação corporal e construir uma autoestima sólida para a vida adulta.

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Dra Natalia Soledade

Dra. Natália Soledade é médica psiquiatra formada pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Uberlândia (2005), com especializações práticas em psiquiatria pela Residência Médica do Complexo Hospitalar Psiquiátrico do Juquery (2007) e no Serviço de Psiquiatria da Infância e Adolescência – SEPIA (2008).

Atende presencialmente em São Paulo e também oferece consultas online. Mãe de menino, apaixonada por viagens e jogar tênis, a Dra. Natália une experiência clínica à sensibilidade de quem valoriza cada história pessoal.

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